Capim Aristida - Plantas Ornamentais do Cerrado

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Panículas Contraídas do Capim Rabo de Raposa (Aristida riparia)
Foto cedida gentilmente pela arquiteta e paisagista Mariana Siqueira


Inicialmente eu vou fazer uma leve introdução sobre quem são os capins/gramíneas do gênero Aristida.

Posteriormente vou falar de forma mais aprofundada a respeito de algumas espécies do gênero que possuem potencial ornamental.

Importância dos Capins no Cerrado

No cerrado nós podemos encontrar diferentes tipos de vegetação. Podemos encontrar vegetações mais florestais, como o Cerradão, onde a flora é composta basicamente por espécies de árvores, e podemos encontrar vegetações mais campestres, como o Campo Sujo, onde a flora é composta basicamente por espécies de capins/gramíneas e arbustos (o chamado “estrato herbáceo”).
Campo Sujo durante a estação das chuvas na Serra de Caldas Novas
Foto feita por mim durante visita ao Parque Estadual da Serra de Caldas Novas (PESCAN)
Caldas Novas, Goiás, Brasil

Considerando o bioma inteiro, existem 6 vezes mais espécies de capins e arbustos do que espécies de árvores. Em um hectare de cerrado típico, podem existir em torno de 160 diferentes espécies de capins e arbustos e 80 espécies de árvores. No cerrado, o estrato herbáceo representa cerca de 60 a 80% das 12.000 espécies nativas conhecidas.

É por isso que quando falamos em preservar/restaurar o cerrado, é muito importante considerar o plantio das pequenas plantas que cobrem o solo, como os capins. Cerca de 442 espécies de capins nativos existem na região do cerrado. Infelizmente, quando as pessoas querem restaurar uma área de cerrado degradado, elas acabam investindo apenas no plantio de espécies de árvores, ou pior, em espécies de capins exóticos invasores como Melinis e Urochloa.

Utilização dos Capins Nativos

Existem várias explicações para a não utilização de espécies nativas no nosso país, seja pra restauração ou paisagismo:

(1) Falta de interesse na nossa própria flora

Por muitos anos a flora nativa Brasileira foi completamente desprezada, só recentemente que ouve uma valorização das espécies nativas do nosso país.

(2) Baixa disponibilidade de mudas e sementes no comercio

O que ocorre normalmente é que as pessoas simplesmente não encontram essas plantas nativas para comprar. O mercado só investe na produção de mudas e sementes se tiver demanda, e a maioria dessas espécies nativas são desconhecidas para o grande público. Às vezes até existe o interesse do público, porém não existe uma padronização para a produção dessas plantas em escala comercial. Falando de maneira generalizada, são raras as espécies nativas que passaram por algum tipo de seleção para serem cultivadas em grande escala (plantas como o Abacaxi e o Maracujá são exemplos).

No caso dos capins, ainda existe o problema da falta de conhecimento sobre as espécies. Muitas vezes não sabemos informações básicas como: (1) período de reprodução; (2) produção de sementes ao longo dos anos; (3) comportamento das mudas em seus primeiros meses de vida (como elas lidam com o solo, chuva, fogo, competição e herbívoros ?).

(3) Pouca tradição de uso dos capins no Brasil como plantas ornamentais

Por costume, quando se fala em plantas ornamentais, a primeira coisa que vem à cabeça das pessoas são plantas floríferas, ou com folhagens diferenciadas. Raramente alguém pensa em utilizar capins para ornamentação doméstica.

Com este guia espero diminuir um pouco do desconhecimento que cerca os capins nativos do cerrado, mais especificamente os capins do gênero Aristida.

Gênero Aristida – Informações Básicas

Taxonomia, Localização e Habitat

Todos os capins pertencem a família Poaceae (se lê, “Poace”), mas essa família está dividida em várias subfamílias e tribos diferentes. Cada tribo possui suas próprias características, e capins que compartilham a mesma tribo possuem muitas características parecidas. O gênero Aristida pertence a tribo Aristideae (se lê, Aristide), e essa tribo pertence a subfamília Aristidoideae (se lê, Aristidoide). O gênero Aristida possui aproximadamente 280 espécies distribuídas ao redor do mundo. No Brasil podem ser encontradas 38 espécies, 11 delas completamente endêmicas (ou seja, só existem aqui).
Espécies de capins do gênero Aristida encontradas no Brasil
Foto retirada do site “floradobrasil.jbrj.gov.br


Grande parte das espécies são especializadas em viver em ambientes mais secos, onde as chuvas cessam durante parte do ano (savanas, estepes), ou onde ela é rara o ano inteiro (desertos). Geralmente elas são encontradas em solos com pH mais ácido, com elevadas concentrações de alumínio e baixa fertilidade natural.
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Brilho dourado das panículas secas dos capins do gênero Aristida
Parque Nacional da Chapada dos Veadeiros, Goiás, Brasil

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Panículas Contraídas do Capim Rabo de Raposa (Aristida riparia)
Foto de Keiko Fueta Pellizzaro, cedida gentilmente pela arquiteta e paisagista Mariana Siqueira


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Touceira Cespitosa Ereta do Capim Barba de Bode (Aristida jubata)
Paraná, Brasil
Foto de Valdir Carlos Frankenberger, retirada do grupo do Facebook “Identificação Botânica

Touceira Cespitosa Ereta do Capim Barba de Bode (Aristida jubata)
Foto de Djalma Rosa, retirada da página do Facebook “Rede Brasileira de Restauração Ecológica


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Capim Barba de Bode (Aristida jubata) crescendo no barranco
Rio de Janeiro, Brasil
Foto de Felipe Tubarão, retirada do grupo do Facebook “Identificação Botânica

Os solos que geralmente apresentam essas características são: Latossolos, Argissolos, Neossolos, Cambissolos, Plintossolos, etc. (clique no nome do solo pra saber mais sobre ele). A maior parte das espécies do gênero são perenes (ou seja, vivem por vários anos), mas também existem espécies que vivem de forma anual e bianual.

Reprodução e Adaptações

No Brasil, a vida das espécies do gênero Aristida gira em torno das estações seca e chuvosa. No final da estação chuvosa as plantas florescem, são polinizadas pelo vento (ou fazem autofecundação) e as sementes desenvolvidas são liberadas no início da estação seca.
Campo Sujo durante a estação seca na Serra Dourada
Foto feita por mim durante visita ao Parque Estadual da Serra Dourada
Goiás, Brasil

Infelizmente nem todas as sementes produzidas por essas plantas são viáveis para a germinação (uma característica comum pra maioria das espécies de capins nativos), em Aristida riparia e Aristida torta apenas 80% das sementes chegam a ser viáveis para germinar, já em Aristida recurvata e Aristida setifolia a viabilidade gira em torno dos 20 a 80%.

As sementes do gênero Aristida são bem especializadas. Elas são levíssimas e possuem grandes aristas, que permitem com que elas sejam levadas pelo vento por grandes distâncias em situações favoráveis.
Inflorescência do tipo Panícula Contraída do Capim Aristida circinalis
Santa Catarina, Brasil

A região pontuda da semente (chamada de calo) possui pelos rígidos apontados para trás (como se fosse um arpão), permitindo com que a semente se agarre com firmeza em qualquer fresta ou buraco que entrar. O objetivo da semente é ser parcialmente enterrada, enquanto espera dormente pela volta da estação das chuvas.
Aristas do capim nativo Aristida circinalis
Modificação que eu fiz da ilustração retirada do artigo intitulado “A Monograph of the Genus Aristida

Aristida recurvata possui até um mecanismo de fotoinibição em suas sementes (a maioria das sementes não germina na presença de luz), então elas realmente preferem ficar levemente enterradas. Ficando enterradas a 3 cm de profundidade elas ficam protegidas até do fogo.

Além da água, flutuações diárias de temperatura (ou seja, a variação do calor ao longo do dia) e fumaça (geradas pelo fogo) são pistas utilizadas pelas sementes para poder germinar. Pesquisadores constataram que Aristida riparia e Aristida recurvata possuem taxas mais elevadas de germinação quando as sementes (enterradas) são expostas a fumaça.

Dormência e Longevidade das Sementes

As sementes possuem dormência tegumentar, ou seja, a casca dura dificulta que água e oxigênio cheguem até o embrião (sem água e oxigênio o embrião da semente não germina). Porém essa dormência é temporária, com 6 a 12 meses ela diminui muito e já permite com que as sementes possam germinar. Por isso é muito recomendável que as sementes sejam armazenadas primeiro antes de serem semeadas para o plantio.

Antes do armazenamento, as sementes de Aristida recurvata levam cerca de 36 dias pra germinar, Aristida riparia 31 dias, Aristida torta 45 e Aristida setifolia incríveis 74 dias (quase 3 meses). Depois de 12 meses de armazenamento, as sementes de Aristida recurvata levam cerca de 19 dias pra germinar, Aristida riparia 14 dias, Aristida torta 9 dias e Aristida setifolia apenas 8 dias (isso em média, é claro).
Sementes armazenadas do capim Aristida setifolia
Goiânia, Goiás, Brasil

Como eu disse anteriormente, a dormência das sementes é temporária, é isso pode ser um grande problema. Essa característica (comum em grande parte dos capins nativos do cerrado) faz com que as sementes tenham uma baixa longevidade, o que diminui muito seu tempo de armazenamento. Diferente dos capins exóticos invasores que podem formar bancos de sementes no solo por períodos de até 8 anos, as espécies nativas formam bancos de semente que duram curtos períodos de tempo (geralmente de 2 a 3 anos).

Pesquisas feitas com Aristida setifolia e Aristida riparia mostram que a germinação de suas sementes é reduzida depois de 2 anos de armazenamento. Essa redução foi constatada nas condições ideias de um laboratório, em habitat natural essa redução deve ser ainda maior (por conta da hostilidade do ambiente). Isso significa que o banco de sementes no solo precisa ser renovado continuamente. Se algo acontecer com as plantas adultas e o estoque de sementes não puder ser renovado nesse intervalo de pelo menos 2 a 3 anos, a regeneração natural da vegetação poderá ficar comprometida.

Bom, mas agora vamos falar do desenvolvimento das sementes depois de germinadas.

OBSERVAÇÃO – quando for comprar sementes de capins nativos, SEMPRE verifique a data em que as sementes foram coletadas. Essa informação é muito importante. Nem todas as sementes produzidas por capins são viáveis para a germinação, e se você não se atentar e ainda comprar sementes muito velhas (com mais de 3 ou 4 anos) vai estar praticamente jogando o seu dinheiro fora.

Crescimento das Mudas

As mudas recém germinadas estão bem adaptadas ao processo de precipitação ocasional. Durante o início da estação chuvosa as precipitações podem ser bem irregulares, o que significa que o nível de umidade do solo pode ser bem variável. A superfície do solo pode passar de encharcada a completamente seca em apenas alguns dias.

Ciente dessas condições, as mudas recém germinadas direcionam todo o seu crescimento para as raízes, lançando uma longa raiz principal para as profundezas do solo.
Muda do Capim Barba de Bode (Aristida jubata) com sua longa raiz
Foto de Hamilton Cezar (@anjosdamataatlantica)

O Hamilton Cezar é o coordenador do projeto "Anjos da Mata Atlântica" (@anjosdamataatlantica).
O projeto tem como objetivo reintroduzir espécies de árvores e plantas nativas raras no meio urbano, através de plantios comunitários, envolvendo a população local e criando uma nova consciência coletiva de preservação.

Em uma pesquisa feita com Aristida longiseta (capim nativo dos EUA), foi constatado que a raiz primária das mudas recém germinadas conseguiam atingir um comprimento médio de 37 cm em apenas 30 dias. Só depois de alcançar esse comprimento que a raiz primária se dividia, e as secundárias ao surgirem, continuavam a crescer para baixo.
Touceiras do capim exótico Aristida longiseta
Foto de Matt Lavin

Enquanto a raiz apresenta uma rápida taxa de crescimento, a parte aérea (caule e folhas) costuma crescer bem mais lentamente. Com exceção de Aristida setifolia, as espécies do gênero Aristida (e várias outras espécies de capins nativos do cerrado) não costumam florescer no primeiro ano de semeadura (ou seja, no seu primeiro ano de vida). Elas passam o primeiro ano investindo no crescimento do sistema radicular, e só no ano seguinte investem na reprodução (depois de estarem bem estabelecidas). Se as condições do ambiente não estiverem favoráveis, podem se passar muitos anos até que as espécies possam finalmente florescer.

Já foi verificado (em projetos de restauração ecológica) que esse padrão de crescimento mais lento da parte aérea não é alterado nem com a adição de adubos no solo. Na verdade, a utilização de adubos para promover o crescimento das espécies nativas é TOTALMENTE DESACONSELHÁVEL. As espécies de capins exóticos invasores (que foram trazidas ao Brasil para alimentar principalmente o gado) possuem um investimento muito grande em sua parte aérea (muitas foram melhoradas geneticamente para crescer rápido), então eles se beneficiam de qualquer fonte de adubo disponível. Quando o solo é adubado, os capins exóticos se desenvolvem rapidamente e abafam completamente as espécies de capins nativos, que possuem um crescimento bem mais lento.

É justamente por isso que Aristida setifolia é uma das espécies de capins nativos mais recomendada para projetos de restauração ecológica. É uma espécie perene e que floresce logo no seu primeiro ano de semeadura (ou seja, cresce rápido), o que garante uma rápida ocupação do espaço, conseguindo competir com as espécies exóticas invasoras.

Espécies com Potencial Ornamental

O Capim Barba de Bode (Aristida jubata) e o Capim Rabo de Raposa (Aristida riparia) são de longe as espécies mais ornamentais do gênero, chamando atenção pela sua beleza exótica e elegância. Fiz uma publicação pra cada uma dessas espécies, e outras que eu também acredito que tenha algum potencial ornamental.

Nas publicações eu falo sobre: Identificação; Habitat e Utilização; Cultivo e Ocorrência (é só clicar no nome das espécies pra acessar a publicação):



Essas publicações aqui não são sobre o gênero Aristida, porém vale muito apena você conhecer:

Identificando Capins Ornamentais Nativos


Como plantar Capins Nativos ?

Para o plantio de mudas ou sementes de capins nativos para restauração ambiental, eu recomendo as seguintes leituras:



Referências

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