Diferentes Tipos de Plantas Epífitas e suas Adaptações
Com base no livro do pesquisador Raunkier (o livro se chama The life forms of the plants and statistical geography), e no livro do pesquisador David H. Benzing (Vascular Epiphytes General Biology and Related Biota) nós podemos classificar as plantas epífitas de duas maneiras diferentes. A primeira maneira é conforme a dependência que a epífita tem da árvore (se ela consegue viver a vida inteira em cima dela), e a segunda maneira é com base em quanto tempo a epífita consegue resistir a ficar sem água (mais resistente ou menos resistente a desidratação)
Todas as plantas epífitas vivem em
cima de outras plantas (geralmente árvores), mas entre as epífitas, existem
aquelas que conseguem viver tranquilamente em cima da árvore, e existem aquelas
que não conseguem viver tão bem tendo só a árvore como apoio.
As plantas epífitas que conseguem
viver tranquilamente em cima da árvore são chamadas Holoepífitas.
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Bromélia-guzmânia (Guzmania sp), na Serra do Mar, Brasil
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As Holoepífitas são plantas que não tem nenhum contato com o solo em nenhum momento de suas vidas, passam a vida INTEIRA em cima da árvore, desde o seu nascimento até a sua morte.
As Bromélias e as Samambaias são as Holoepífitas mais comuns que conseguimos encontrar nas florestas, e elas podem ser encontradas nos mais variados tamanhos possíveis, das diminutas com apenas alguns centímetros de comprimento, as gigantes, como essa Samambaia das Palmeiras (Phlebodium aureum), com folhas que podem chegar até 1 metro e meio de comprimento.
Essas plantas tem um início de vida muito complicado. Elas precisam encontrar um jeito de obter água, nutrientes e luz solar estando a vários e vários metros de distância a cima do solo. Imagina o quanto é difícil para uma planta que acabou de germinar sobreviver a essas condições?
Para a semente germinar, ela precisa
de água, e para crescer ela precisa de nutrientes, mas é muito difícil dela
conseguir isso estando em cima de uma árvore. Ela só vai conseguir água se
chover, e SE ela tiver a sorte de chover (por isso ela precisa resistir muito
bem a falta de água – geralmente essas plantas fazem isso armazenando água em
suas folhas/caules ou mesmo chegam a ficar completamente dormentes por toda a
estação seca, só voltando a ficar ativas quando as chuvas voltam), e ela
precisa ter a sorte de cair em um local onde tenha quantidades de nutrientes suficientes
para ela conseguir se sustentar (geralmente os nutrientes são levados pelo
vento, em forma de poeira, e ficam presos nas raízes da planta ou do galho onde
ela está, e são absorvidos pelas raízes quando eles entram em contato com água
– as raízes só absorvem os nutrientes se estes estiverem misturados com água,
nutrientes secos não são absorvidos). Como é muito difícil de obter nutrientes
estando em cima de uma árvore, as plantas acabam não crescendo muito, então é
por isso que as plantas epífitas crescem de maneira tão devagar e ficam tão
pequenas (menos nutrientes = menos crescimento = planta pequena).
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Muda de Cacto Macarrão (Rhipsalis cf. teres), germinada em um tronco, Rio de Janeiro, Brasil
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Tillandsia (também conhecidas como Plantas do Ar) é gênero da família das Bromélias. Esse gênero tem plantas tão pequenas que cabem até na palma da mão Fonte |
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Fruto da Orquídea Sumaré (Cyrtopodium eugenii).
Fotos feitas por mim durante visita ao Parque Estadual da Serra de Caldas Novas (PESCAN), Caldas Novas, Goiás, Brasil.
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No caso da Orquídea Sumaré, nada. Essa planta não produz nenhuma substância atrativa, ao em vez disso ela ENGANA o seu agente polinizador, fazendo ele transportar o seu precioso pólen sem ganhar nada em troca. Como ela faz isso?
Na mesma área onde ocorre a Orquídea Sumaré, existe uma outra planta que se reproduz na mesma época. Essa planta se chama Tetrapterys ramiflora, e ela é da família das Malpighiaceas (mesma família da Acerola, do Murici e do Lanterneiro). Ao contrário da Orquídea Sumaré, essa outra planta produz atrativos em suas flores para atrair agentes polinizadores (que nesse caso são abelhas atraídas por óleos comestíveis produzidos por ela), e é ai que mora o “pulo do gato”.
A flor da Orquídea Sumaré mimetiza (isto é, imita) a flor da Tetrapterys ramiflora, e com isso ela passa a receber a visita das abelhas mesmo não oferecendo absolutamente NADA em troca (falando em bom português, a orquídea faz a abelha de otária).
Além desse mecanismo de enganar as
abelhas, essa orquídea tem uma outra tática para garantir que a sua floração
não vai ser uma total perda de energia. Ela floresce no meio da estação seca em
Goiás (Junho, Julho, Agosto), e ela faz isso para aumentar as chances de suas
flores serem polinizadas (entre as 12 espécies de orquídeas do parque, é a
única que faz isso). Como são uma das poucas plantas que florescem nessa época,
as chances de uma abelha coletar o pólen da orquídea, e levar DIRETO para uma OUTRA
orquídea, são muito maiores (fazendo isso o pólen precioso não se perde no meio
do caminho).
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Flor da Tetrapterys ramiflora Foto feita por mim durante visita ao Parque Estadual da Serra de Caldas Novas (PESCAN), Caldas Novas, Goiás, Brasil |
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Flor da Orquídea Sumaré (Cyrtopodium eugenii). O labelo amarelo (que é uma pétala modificada da flor das orquídeas) mimetiza a flor de Tetrapterys ramiflora, que também é amarela. Reparem o pólen da orquídea grudado na cabeça da abelha
Fotos do Professor Dr. Climbiê Ferreira Hall, da UFG, retiradas da sua dissertação intitulada “Orchidaceae do Parque Estadual da Serra de Caldas Novas, Goiás, Brasil”
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A abelha Centris (Trachina) fuscata aparentemente é a única abelha responsável por polinizar as flores da Orquídea Sumaré (Cyrtopodium eugenii) no PESCAN. Essa abelha gosta de coletar óleos florais comestíveis da planta Tetrapterys ramiflora
Foto tirada por Julio Pupim (agricultor conselheiro da SOS Abelhas sem Ferrão)
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Essa dificuldade de reprodução somada a alta
mortalidade das sementes e mudas (a maioria das sementes acaba germinando em um
local pouco apropriado, o que acaba levando a morte das mudas, ou até mesmo
elas nem germinam) acaba fazendo com que as populações (isto é, a
quantidade/número de plantas) de plantas epífitas sejam absurdamente baixas na
natureza (a quantidade de plantas é pequena, e elas estão muito distantes uma
das outras). É por isso que é tão difícil de encontrar essas plantas quando
você está em caminhando por uma floresta. Aqui em Goiás, devido ao fato de
termos uma estação seca muito prolongada (além da baixa umidade do ar – clima
típico de Savanas), é ainda mais difícil de achar essas plantas.
Agora voltando ao nosso assunto principal. Já as plantas que não conseguem
viver tranquilamente em cima das árvores são chamadas de Hemiepífitas
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Jiboia (Epipremnum pinnatum) subindo pelas paredes da faculdade de História
Fotos feitas por mim na Universidade Federal de Goiás (UFG), Campus Samambaia, Goiânia, Goiás, Brasil
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Raízes de Philodendron bipinnatifidum no tronco de árvore, São Paulo, Brasil
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As Hemiepífitas são plantas que, em
pelo menos algum período de sua vida, estão conectadas ao solo para obter água
e nutrientes (ou seja, em algum momento da vida delas elas precisam recorrer a
água e os nutrientes que estão no chão, iguais as outras plantas terrestres).
Existem 2 tipos de Hemiepífitas, as
Hemiepífitas Primárias e as Secundárias
🌿Primárias🌿
As Hemiepífitas Primárias, desde o
momento em que nascem, vivem como se fossem uma Holoepífita comum (capturam
água e nutrientes em cima da árvore onde estão), só que em determinado momento
das suas vidas (quando vão ficando mais velhas) elas passam a emitir raízes que
vão em direção ao solo, e passam a receber água e nutrientes como se fossem uma
planta terrestre (o caule e as folhas da planta estão em cima da árvore, mas
suas raízes estão lá no chão).
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Figueira (Ficus sp) no tronco de uma palmeira, Monument Lake NP Campground, Flórida, Estados Unidos. Foto tirada por Joyce & Mike Hendrix |
As figueiras pertencem a família Moraceae (essa é família da Jaca, da Amora, da Mama Cadela, etc), e essa família tem característica bem especial, que é a produção extensiva de Xilema. Xilema é um tipo de tecido vegetal (assim como os animais produzem tecidos – como por exemplo, o tecido muscular – as plantas também produzem tecidos), e é ele que é o responsável por formar o que conhecemos popularmente como Madeira (ou lenho). A madeira funciona de uma maneira parecida com os nossos ossos, serve para sustentar a planta em pé. Quanto mais madeira a planta produz, mais alta e mais grossa ela fica, e é ai que mora o “problema” com relação as figueiras.
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Essa foto foi retirada do blog do Prof. Djalma Santos, que tem uma publicação muito boa falando a respeito dos diferentes tipos de tecidos vegetais. |
O que acontece é que, enquanto a figueira viver como uma planta Holoepífita (sem ter contato nenhum com o chão), nada de mal acontecerá com a árvore que ela usa como suporte (o nome correto dessa árvore que está sendo usada como suporte é Forófito). Se as raízes da figueira NUNCA chegarem ao solo, a árvore suporte não vai precisar se preocupar. O grande problema é quando as raízes da figueira conseguem entram em contato com o solo, aí tudo muda. A figueira passa a ter acesso a água e nutrientes de maneira mais abundante e constante, e com isso o seu crescimento dispara descontroladamente (ela passa a emitir muito mais folhas, caule e raízes do que de costume). Como ela produz muita madeira, o caule e as raízes da figueira passam a ficar cada vez mais grossos com o passar da idade, e com o passar dos anos acaba que a árvore que serve como suporte passa a ser literalmente estrangulada pela figueira. Quando o caule da árvore começa a ser apertado pela figueira, a água e os nutrientes absorvidos pela raiz não conseguem chegar direito as folhas, então pouco a pouco elas vão morrendo e deixando de fazer fotossíntese. Quando a árvore passa a fazer menos fotossíntese, ela acaba tendo menos energia disponível para sustentar as outras partes do seu corpo (caule e raízes), então ela para de crescer. Quando o estrangulamento está em um nível muito avançado, a árvore suporte para de fazer fotossíntese, e não consegue mais mandar energia para as outras partes do seu corpo, então acaba que os tecidos da raiz morrem, e com isso a árvore não consegue mais absorver água ou nutrientes, e assim a árvore entra em completo colapso e morre.
Todo esse sofrimento (que chega a ser agoniante) pode se arrastar por várias e várias décadas, e quando ele terminar, a figueira já terá um tamanho tão grande que vai passar a ocupar totalmente o lugar da árvore que um dia foi o seu suporte.
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Raizes de Clusia sp em volta da árvore morta, Serra dos Órgãos, Brasil
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Raízes de Figueira Asiática (Ficus microcarpa), Hong Kong, China
Fotos de PatrickBlanc’s (Copyright Pascal Heni) |
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Ficus altissima formando uma catedral de raízes. Reserva Natural Tangkoko, Ilha Celebes do Norte, Indonésia
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Figueira Branca (Ficus gomelleira) |
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Imagem ilustrativa de todo o processo Fonte |
🌿Secundárias 🌿
As Hemiepífitas Secundárias,
ao contrário das primárias, nascem no solo como plantas terrestres (ou seja,
germinam no solo como uma planta comum), mas em determinado momento de suas
vidas (quando vão ficando mais velhas) o caule dessas plantas passa a querer
subir em cima de uma árvore, e na medida que vão crescendo elas passam a emitir
raízes sobre ela (soltam raízes principalmente pra se fixar ao tronco da
árvore, mas essas raízes também podem servir para absorver água e nutrientes se
for possível – por exemplo quando as raízes entram em um fenda/buraco/bolsão na
árvore que possuem matéria orgânica em decomposição ). Ou seja, a planta possui
caule e raízes conectadas ao solo (como uma planta terrestre) mas também possui
folhas, caule e raízes conectadas a árvore (como uma planta epífita).
Essa é a principal diferença entre
as plantas Epífitas e as plantas Trepadeiras. As trepadeiras dependem UNICAMENTE
do solo para obter água e nutrientes (elas se agarram as árvores com outras estruturas
que não são raízes), já as epífitas (no caso específico, as Hemiepífitas
secundárias) conseguem obter água e nutrientes do solo OU da árvore que elas usam
como suporte.
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Philodendron bipinnatifidum, Curitiba, Brasil
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Cacto Epífito Hylocereus setaceus, Inhotim, Minas Gerais
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Cacto Sianinha ou Zig-Zag (Selenicereus anthonyanus), Goiânia, Goiás, Brasil Fotos feitas por mim em minha casa |
Pode acontecer da Hemiepífita
secundária perder a conexão que ela tem como o solo (apodrecimento do caule e
raízes por exemplo) e passar a ter o caule e as raízes apenas em cima da árvore
que ela usa como suporte. Se isso acontecer, e a planta NÃO emitir novas raízes
em direção ao solo, ela passa a ser considera como uma planta Holoepífita
comum, mas se isso acontecer, e ela EMITIR raízes para se conectar com o solo
novamente, ela passa a ser considerada novamente como uma planta Hemiepífita Secundária.
Agora vamos falar da outra forma de
classificação das plantas epífitas, que é com base na resistência a falta da
água (na verdade todas as outras plantas podem ser classificadas dessa maneira
também, mas vou dar exemplos só de plantas epífitas, está bem?). Nessa
classificação, as epífitas passam a ser divididas em duas categorias, as das plantas Poiquilohídricas e a das plantas Homoídricas.
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Tillandsia (Tillandsia xiphioides var. xiphioides) em cacto na Província de La Rioja, Argentina Foto tirada por Zoya Akulova 2007 |
☀Poiquilohídricas☀
As plantas Poiquilohídricas são plantas que NÃO possuem a capacidade de regular o conteúdo de água do próprio corpo (ou seja, as plantas não conseguem manter SOZINHAS o conteúdo de água de suas folhas, caule e raízes). Isso significa que as plantas só se mantem hidratadas (ou seja, com água dentro de suas folhas, caules, raízes) se estiverem vivendo em um ambiente com umidade ao redor delas, se o ambiente não tiver umidade ao redor (ou seja, se ele secar) as plantas simplesmente secam também (é por isso que essas plantas só conseguem viver em ambientes úmidos, como florestas). O fato dessas plantas secarem não significa que elas estão mortas, pelo contrário, quando elas começam a secar, elas entram meio que em um estado de dormência, e ficam assim até que o ambiente ao redor delas volte a ficar úmido novamente (elas podem ficar desse jeito por várias e várias décadas). Essas plantas que conseguem fazer isso são chamadas popularmente de “Plantas da Ressureição”, porque quando elas estão nesse período de dormência, elas ficam com uma aparência de mortas (ficam enrugadas, quebradiças e perdem a cor verde), mas assim que são molhadas (reidratadas) elas passam a ficar verdes novamente, como se tivessem “voltado a vida”.
As plantas Poiquilohídricas conseguem se manter vivas mesmo depois de perder mais de 76 % de água do seu interior (elas realmente ficam BEM secas). As plantas que não são Poiquilohídricas (ou seja, as plantas Homohídricas) simplesmente morreriam se perdessem algo entorno de 12 % água.
O melhor exemplo de plantas epífitas
Poiquilohídricas são as Samambaias da Ressurreição (Polypodium polypodioides).
Essas plantas costumam habitar
grandes árvores antigas, com a casca estando bem rugosa e já coberta de musgos
e líquens. Quando a umidade ao redor começa a diminuir, as plantas rapidamente
começam a se enrolar, mas ao menor sinal da sua volta, as folhas se abrem
novamente em questão de poucas horas.
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Samambaia da Ressurreição (Polypodium polypodioides) na estação das chuvas Fonte |
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Samambaia da Ressureição (Polypodium polypodioides) na estação da seca
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Samambaia da Ressurreição (Polypodium polypodioides) plantada em um pé de Alfavacão (Ocimum gratissimum), Goiânia, Goiás, Brasil Fotos feitas por mim em minha casa |
☆Homohídricas☆
Já as plantas Homohídricas, ao contrário das Poiquilohídricas, possuem a capacidade de regular SOZINHAS o conteúdo de água do próprio corpo, ou seja, as plantas não dependem TOTALMENTE do ambiente aonde estão para se manterem hidratadas (elas conseguem armazenar a água e diminuir ao máximo perca dela, se mantendo assim hidratadas por muito tempo). Isso significa que as plantas se mantem hidratadas mesmo se estiverem vivendo em ambientes muito secos (como desertos).
Porém, apesar das plantas Homohídricas conseguirem regular SOZINHAS o conteúdo de água do próprio corpo, existem aquelas plantas que conseguem regular mais o conteúdo de água (e assim podem viver em ambientes mais secos), e existem aquelas plantas que conseguem regular menos (e assim só podem viver em ambientes mais úmidos). As plantas que conseguem regular mais são chamadas de Xerófitas, e as plantas que conseguem regular menos são chamadas de Hidrófitas. E o meio termo entre elas é chamado de Mesófitas.
As plantas Xerófitas vivem em ambientes onde a disponibilidade de água é muito limitada. São lugares onde a chuva cai de maneira muito irregular, geralmente em espaços curtos de tempo e em poucas quantidades ao longo do ano. Os desertos são ambientes onde podemos encontrar plantas Xerófitas.
Já as plantas Hidrófitas vivem em ambientes onde disponibilidade de água é muito alta. São lugares onde a água está presente 24 h por dia, durante a maior parte do ano. Os melhores lugares para se encontrar plantas hidrófitas são em lagos e rios (seja na beira da água, dentro da água ou na superfície da água).
Já as plantas Mesófitas vivem em
ambientes onde a disponibilidade de água é bem constante. São lugares onde a chuva
cai de maneira muito regular, e em grandes quantidades ao longo do ano. A
maioria das plantas do nosso planeta são mesófitas, e a maioria das espécies
nós podemos encontrar vivendo nas florestas.
As plantas Xerófitas e Mesófitas (com
relação as mesófitas, principalmente aquelas de florestas mais secas, como aquelas
encontradas no Cerrado) são as plantas que mais possuem estratégias para evitar
a desidratação, e por conta disso elas acabaram adquirindo (ao longo de milhões
de anos de evolução) vários mecanismos para conservar a água.
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Ilha Santa Catalina, Baixa Califórnia, México
Foto tirada por Glenn McCrea (© 2015Glenn)
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Aquário Natural, Bonito, Mato Grosso do Sul, Brasil
Foto tirada por Ana Paula Bernardo
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Orquídea Sumaré (Cyrtopodium eugenii). Fotos feitas por mim durante visita ao Parque Estadual da Serra de Caldas Novas (PESCAN), Caldas Novas, Goiás, Brasil |
Um outro mecanismo para evitar a perca de água é simplesmente diminuir ou não ter estruturas que naturalmente perdem muita água (é como fazer economia com dinheiro, pra você economizar dinheiro você precisa cortar tudo aquilo que gera gastos, com as plantas funciona do mesmo jeito).
O mecanismo da fotossíntese é um dos
principais responsáveis por levar a planta a perder água. Para a planta fazer
fotossíntese, ela precisa absorver o CO2 que está na atmosfera, não é mesmo?
Você se lembra de que maneira ela faz isso?
Ela faz isso abrindo os seus
estômatos, que são estruturas iguais a janelas (abrem e fecham) e existem
centenas delas em uma única folha. É através desses pequenos buraquinhos que o
CO2 entra para dentro da folha para participar do processo da fotossíntese. Só
que tem um porém nisso tudo.
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Imagem ilustrativa de uma folha, mostrando o estômato no lado de baixo da folha
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Quando a planta abre os seus estômatos para a passagem do CO2 (para ele entrar dentro da folha), acaba que, inevitavelmente, a água que está DENTRO da folha simplesmente acaba SAINDO para o lado de fora (ela sai na forma de vapor). Ou seja, se a folha abrir os seus estômatos para a entrada do CO2, a água vai acabar saindo (escapando), e assim ela vai acabar ficando desidratada.
As folhas (que são as principais responsáveis por fazer a fotossíntese) são as partes da planta que mais perdem água. Imagine as folhas como se fossem roupas molhadas estendias em um varal, está bem?
O que acontece quando você estende a roupa em um dia de sol forte e muito vento? A roupa seca rapidamente, não é? A mesma coisa acontece com as folhas. As folhas são estruturas muito delicadas e que ficam muito expostas ao ambiente, e o vento e o sol, por incrível que pareça, são agentes que são capazes de prejudicar muito as folhas. O vento age levando o vapor de água embora (é como se ele sugasse o vapor de água que sai das folhas) e o sol age de duas maneiras diferentes, e eu vou tentar explicar da maneira mais simplificada que consigo.
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A primeira maneira de como o sol age prejudicando as folhas é através da PRÓPRIA fotossíntese (sim, por incrível que pareça). Se a planta receber luz de mais (e com luz de mais, me refiro aquela radiação insuportável do 12:00), ela acaba fazendo muita fotossíntese, e quando ela faz muita fotossíntese, ela acaba gerando muitas substâncias prejudiciais dentro dela mesma (tudo de mais faz mal, lembra?). Se essas substâncias ficarem muito tempo acumuladas dentro da folha, elas podem acabar queimando a planta inteira (sabe quando você pega aquela planta que está na sombra e coloca no sol, e ela acaba ficando queimada? É por conta dessa produção de sustâncias prejudiciais em excesso – elas são chamadas de Espécies Reativas de Oxigênio).
Essas aqui são as folhas de um pé de Abacate. Elas estavam crescendo sobre a sombra de um pé de Jacarandá (ou seja, elas recebiam pouca luz, não tinham proteção para receber muita luz). Só que infelizmente o pé de Jacarandá acabou caindo, e as folhas do pé de Abacate acabaram ficando muito expostas a luz (e com mais luz, ele acabou fazendo muita fotossíntese). Como resultado do excesso de luz repentino, a planta começou a gerar muitas substâncias prejudiciais em um curto espaço de tempo, de uma vez só, e isso acabou queimando a folha completamente. Para as folhas ficarem expostas ao sol, elas precisam receber algum tipo de proteção da planta (é como se elas precisassem de algum tipo de protetor solar, literalmente).
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Exemplo do que o excesso de luz pode causar nas folhas do Abacate (Persea americana). Fotos feitas por mim no meu quintal, Goiânia, Goiás, Brasil |
É por isso que a maioria das plantas que vivem em climas mais quentes simplesmente NÃO FAZEM FOTOSSÍNTESE O TEMPO TODO. Elas fazem fotossíntese sempre nas horas mais frescas do dia, começando as 07:00 e indo até as 10:00 da manhã, fazendo uma pausa durante a tarde (11:00 as 15:00), e retornando no final do dia (16:00 as 1800). Se elas fizessem fotossíntese durante o dia todo elas simplesmente MORRERIAM.
Eu tirei essas fotos antes das 10:00 da manhã, e o sol já estava simplesmente INSUPORTÁVEL (só de olhar pra essa imagem eu já me lembro do calor que estava fazendo na hora). Imagine ficar o dia todo de baixo desse sol sem nenhum tipo de proteção? É simplesmente impossível. Em dias de céu azul e sol de rachar, essas plantas só conseguem fazer fotossíntese nas primeiras horinhas da manhã e no finalzinho da tarde e olhe lá.
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Já a segunda maneira de agir é através do aumento da temperatura provocado pela radiação solar (a água que está dentro da folha começa a esquentar, e se ela esquentar de mais ela começa a evaporar mais rapidamente).
Resumindo tudo o que eu falei: o vento e o sol fazem as folhas secarem rapidamente, então para evitar a perda de água excessiva, as plantas protegem as folhas de várias maneiras diferentes.
A primeira maneira de proteger as folhas da desidratação (o que significa querer proteger as folhas do sol e do vento), é uma medida muito simples. Para não perder água através dos seus estômatos, as plantas simplesmente FECHAM os seus estômatos durante o dia. Com os estômatos fechados, não há luz e nem vento que consigam tirar a água de dentro da folha. Essa é uma medida adotada por quase todas as plantas que vivem em ambientes muito secos (plantas suculentas, orquídeas, cactos, quase todas essas plantas fazem isso).
Só que esse tipo de medida tem um problema. Se os estômatos estão fechados durante o dia, o CO2 não entra pra dentro da folha, e se o CO2 não entra pra dentro da folha, a planta não faz fotossíntese, e se elas não fazerem fotossíntese, elas morrem. Então, o que elas fazem nessa situação?
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Cacto Dama da Noite (Epiphyllum oxypetalum). É durante a noite que essas plantas de climas secos estão realmente ativas
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Mais uma vez, a medida adotada para contornar essa situação é muito simples. As plantas simplesmente passam a abrir os seus estômatos SOMENTE DURANTE A NOITE, que é quando a temperatura está bem mais fresca, e o risco de perder água pelas folhas é bem menor. Elas abrem os seus estômatos, e absorvem o MÁXIMO de CO2 que elas conseguem. Depois de ter feito isso, elas deixam o CO2 armazenado dentro das suas folhas até o dia seguinte.
Quando o dia começa a clarear (lembre-se, a fotossíntese só pode ser feita na presença de LUZ, mas não luz em excesso, como eu já expliquei anteriormente), as plantas não precisam ficar preocupadas em abrir os seus estômatos, como elas já tem CO2 que foi armazenado na noite anterior, elas podem fazer a fotossíntese tranquilamente com seus estômatos fechados. Fazendo isso elas não correm o risco de perder água que está dentro das suas folhas.
Esse mecanismo que as plantas têm de fechar os estômatos durante o dia e absorver o CO2 somente durante a noite é chamado de Metabolismo Ácido das Crassuláceas (Crassulaceae é família da Flor da Fortuna e da Mãe de Mil, o nome foi dado a essa família como uma homenagem, porque essa estratégia foi descoberta primeiramente nessa família).
Esse é o mecanismo de conservar água
mais eficiente que uma planta pode usar, só que infelizmente ele tem um porém
(parece que tudo na vida tem um porém, é incrível).
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Flor da Fortuna (Kalanchoe blossfeldiana)
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A quantidade de CO2 que a planta
consegue armazenar é limitada (porque o espaço dentro da folha é limitado), o
que significa dizer que a planta não consegue juntar quantidades grandes o suficiente
de CO2 para fazer fotossíntese durante o dia de maneira satisfatória. Ou seja,
isso significa dizer que as plantas que utilizam esse método para conservar
água não conseguem fazer muita fotossíntese durante o dia (elas fazem
fotossíntese de pouquinho em pouquinho), e como elas não conseguem fazer muita
fotossíntese, isso significa que elas crescem MUITOOOOO DEVAGAR em comparação
com as outras plantas que abrem os seus estômatos durante o dia. É por isso que Orquídeas, Cactos e
Suculentas são plantas que crescem tão lentamente (e por isso exigem tanta
paciência). Bom, mas agora vamos voltar a falar
das outras estratégias que são usadas pelas plantas para evitar a desidratação.
Algumas plantas, pra evitar um
aumento de temperatura excessivo nas suas folhas, recobrem a superfície delas com
uma camada grossa de Cutícula. A Cutícula é como uma espécie de cera impermeabilizante,
que evita com que a folha perca água pela ação do sol (se a folha não esquenta,
a água não esquenta, e se ela não esquenta, ela não evapora).
As duas fotos são da mesma folha, mas reparem que na segunda imagem a folha adquire um aspecto meio que reflexivo, consegue ver? Esse reflexo é causado pela Cutícula, que é capaz de refletir o excesso de luz.
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Folha da Orquídea Baunilha (Vanilla planifolia). Fotos feitas por mim no meu quintal, Goiânia, Goiás, Brasil |
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Imagem ilustrativa dos diferentes tipos de tecido que estão presentes em uma folha. A cutícula é produzida pela epiderme da folha Essa foto foi retirada do blog do Prof. Djalma Santos, que tem uma publicação muito boa falando a respeito dos diferentes tipos de tecidos vegetais |
Já outras espécies mais específicas preferem cobrir a superfície das suas folhas com Escamas Protetoras (os chamados Tricomas Peltados).
As plantas mais conhecidas por usar essa estratégia são as bromélias do gênero Tillandsia (que são conhecidas popularmente como Plantas do Ar ou Cravo do Mato). Junto com os cactos, essas plantas são os vegetais mais especializados em viver em ambientes áridos (árido pode ser sinônimo de ambiente Xérico).
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Foto de Tillandsia (Tillandsia tectorum) com suas escamas BEM evidentes Fonte |
Essas escamas que recobrem as folhas das Tillandsias são incríveis. Elas são usadas de maneira espetacular por essas plantas para obter água, nutrientes e refletir o excesso de radiação solar. As raízes das Tillandsias são usadas unicamente para prender a planta no suporte a onde ela está (a raiz não consegue absorver nada), então para se manter hidratada e nutrida, a planta só pode contar com as suas escamas.
O mecanismo de absorção feito pelas escamas é um BEEEEEEM complexo, então eu vou simplificar ele ao MÁXIMO que eu consigo, tudo bem?
Então gente, explicação do mecanismo de absorção acabou ficando MUITO grande, e devido a sua importância, resolvi fazer uma publicação especial só pra ela. Basta clicar no link aqui visualiza-la "Como as Tillandsias conseguem absorver água pelas folhas ?"
Bom, então continuando o nosso assunto sobre as estratégias para evitar a desidratação ...
Já outras plantas param de produzir as folhas na época mais seca do ano e ficam completamente dormentes
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Orquídea Sumaré (Cyrtopodium eugenii). Fotos feitas por mim durante visita ao Parque Estadual da Serra de Caldas Novas (PESCAN), Caldas Novas, Goiás, Brasil |
Essa orquídea só possui folhas durante a época das chuvas. Eu tirei essas fotos em 24 de abril de 2018, ainda estava um pouco longe para a chegada da seca aqui em Goiás, mas o ano de 2018 foi simplesmente HORRÍVEL no quesito chuvas (praticamente não choveu, então as plantas devem ter entrado em dormência mais cedo nesse ano).
Algumas, ao em vez de ficar criando mecanismos para proteger as folhas da perda de água excessiva, simplesmente pararam de produzir folhas e passaram a fazer a fotossíntese exclusivamente em outros locais que perdem menos água (que no caso dos cactos, é o caule).
Com certeza os cactos devem ser as plantas mais conhecidas por adotar essa estratégia
Essa aqui já não é um Cacto, é uma espécie de samambaia MUITO primitiva (é praticamente um fóssil vivo, porque as primeiras plantas vasculares que surgiram no planeta tinham essa mesma aparência) conhecida como Whisk Fern (Psilotum nudum). Assim como os cactos do gênero Rhipsalis, essas samambaias também não têm folhas, é o caule que fica responsável por fazer a fotossíntese (por isso ela consegue viver em lugares mais secos, como aqui em Goiânia, Goiás, Brasil). Além de não ter folhas, incrivelmente elas também não têm raízes (de tão primitivas que são – porque as primeiras plantas vasculares também não tinham raiz e nem folhas). O rizoma dessas samambaias está conectado diretamente a fungos especiais que absorvem água e nutrientes, e esses fungos passam a água e os nutrientes para a samambaia, que em troca sede ao fungo energia oriunda da fotossíntese que ela fez a partir do caule.
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Cacto Macarrão (Rhipsalis baccifera), Serra dos Órgãos, Rio de Janeiro, Brasil
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Cacto Hylocereus undatus
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Cacto Hylocereus costaricensis
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Cacto Flor do Baile (Epiphyllum pyllanthus), Manaus, Amazonas, Brasil Fotos de Patrick Blanc’s(CopyrightPascal Heni) |
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Samambaia Whisk Fern (Psilotum nudum) Fonte |
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Imagem retirada do livro Biologia Vegetal 8º Edição - Peter H. Raven |
É por isso que é muito difícil fazer mudas dessas samambaias, porque a partir do momento que você retira ela da árvore onde ela está, você precisa levar também os fungos que são responsáveis por hidratar e nutrir a planta, se isso não acontecer, a planta inevitavelmente vai acabar morrendo.
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Orquídea Fantasma (Dendrophylax lindenii) Fonte |
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Flor da Orquídea Fantasma (Dendrophylax lindenii), Flórida, Estados Unidos
Foto tirada por
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Se você gosta de plantas Epífitas, recomendo essas leitura aqui
"Germinação e Crescimento do Cacto Epífito Flor do Baile (Epiphyllum pyllanthus)"
"Como as Tillandsias conseguem absorver água pelas folhas ?"
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- Biologia Vegetal - 8ª edição - Peter H. Raven, Susan E. Eichhorn, Ray F. Evert
- Estrutura e Composição de epífitas vasculares em duas formações vegetais na Ilha da Marambaia Mangaratiba, RJ
- Formas de Vida
- Fisiologia Vegetal - 3ª edição - Lincoln Taiz & Eduardo Zeiger
- Orchidaceae do Parque Estadual da Serra de Caldas Novas, Goiás, Brasil
- Pleopeltis polypodioides
- Poikilohydry
- Tillandsias Close Up! by Laurie Dorfer, Illawarra Bromeliad Society
- Whisk fern
linda postagem!!! sucesso
ResponderExcluirMuito obrigado jovem :)
ExcluirTrabalho magnífico. Gracias!
ResponderExcluirMuito obrigado :)
ExcluirQue material incrível!! Super didático, parabéns!!
ResponderExcluirMuito obrigado Rafael, fico feliz por ter gostado :)
ExcluirBooooa
ResponderExcluirAcho que isso significa que você gostou, né ? kkk Se for, obrigado :)
Excluirexcelente essa postagem, muito feliz desse tipo de trabalho existir gratuitamente por aqui, muito obrigada!!! vou ficar como seguidora do blog, com certeza!
ResponderExcluirMuito obrigado jovem :) fico imensamente feliz por você ter gostado da publicação e por se tornar uma seguidora do meu blog, seja bem vinda <3
ExcluirMuito bom! Parabéns!
ResponderExcluirObrigado jovem 😊
ExcluirPARABÉNS LINDAS FOTOS E DETALHES DAS ESPÉCIES
ResponderExcluirMuito obrigado colega 😊
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