Substrato para Plantas Carnívoras – Fibra/Pó de Coco - Parte 1

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Substrato de fibra/pó de coco
Substrato tratado e seco (esquerda); Substrato tratado úmido (centro); Substrato seco sem tratamento (direita)
Antes de falar sobre o motivo da fibra/pó de coco poder ser utilizada como substrato, precisamos falar primeiro sobre alguns aspectos importantes da biologia e hábitos de vida das plantas carnívoras.


Plantas Carnívoras e a Absorção de Nutrientes 
A capacidade de extrair nutrientes de insetos é uma das características que permite com que as plantas carnívoras possam sobreviver em habitats tão pobres em nutrientes, porém, em geral, parece que muitas plantas carnívoras conseguem sobreviver sem capturar insetos, absorvendo todos os nutrientes que precisam apenas através do solo. 
Jarro de Nepenthes mira
Mount Cleopatra, Palawan, Filipinas
Foto de Stewart McPherson

Darlingtonia californica mostra um bom crescimento tanto em solos pobres como em solos ricos (sendo ou não alimentada por insetos). Pinguicula vulgaris e Utricularia uliginosa também podem ser cultivadas em substratos ricos ou pobres (ambas as espécies podem absorver nutrientes do solo sem problemas). As raízes da Drosera capillaris, Drosera aliciae e Drosera spatulata também podem absorver nutrientes do solo, como nitrogênio, fósforo, cálcio e magnésio, mas curiosamente, elas só conseguem absorver os nutrientes do solo se estiverem digerindo alguma presa (é como se a raiz funcionasse apenas quando as folhas capturassem alguma coisa). 
Darlingtonia californica
California, Estados Unidos
Foto de NoahElhardt
Porém, é certo que muitas plantas carnívoras precisam muito dos nutrientes que conseguem absorver dos insetos (ou de outra origem orgânica, como o pólen), e pagam um preço muito alto quando não conseguem captura-los. Algumas espécies tem sua reprodução muito prejudicada (a floração é reduzida, poucas sementes são produzidas) ou acabam tendo suas folhas muito reduzidas. Algumas crescem mais devagar ou até mesmo param de crescer. 
Algumas espécies, como Utricularia gibba, podem sobreviver em um meio sem nutrientes, mas crescem muito lentamente se não capturarem alguma presa. 
Flor da Utricularia gibba
Foto de Dr Dale Dixon (@dale_dixon)

Dionaea muscipula pode até crescer em um solo rico em nutrientes, mas se ficarem muito tempo sem capturar presas, as plantas não produzem novas raízes, poucas flores são produzidas e as poucas sementes produzidas acabam não sendo férteis. Foi constatado que em Dionaeas que crescem em ambiente natural, apenas 8 a 25% do total de nitrogênio absorvido por elas vem do solo, a grande maioria do nitrogênio vem das presas capturadas por elas (sem nitrogênio as plantas não crescem). O mesmo acontece com a Sarracenia leucophylla. Cerca de 60 vezes mais nutrientes são absorvidos através da presa do que do solo onde a planta está. 

A Raiz e o Habitat das Plantas Carnívoras 
Em uma planta “normal”, a raiz sempre vai ter quatro funções principais: 

1 - Ancoragem (firmar a planta no substrato onde ela está) 
2 - Absorção de água 
3 - Absorção de nutrientes 
4 - Armazenamento de nutrientes e fotoassimilados (os produtos que foram fabricados pela fotossíntese).

Plantas carnívoras possuem diferentes tipos de sistemas radiculares. Algumas espécies como a Drosera capensis possuem raízes fortes e bem desenvolvidas, que conseguem cumprir com todas as funções que uma raiz “normal” faria. 
onde-plantar-plantas-carnívoras
Raiz da Drosera capensis
Foto de nimbulano


Porém existem outras que possuem raízes bem frágeis, que não conseguem cumprir direito com a maioria das funções que uma raiz “normal” teria. Algumas espécies nem se quer possuem raízes. Plantas carnívoras aquáticas, como Utricularia e Genlise, perderam totalmente as raízes e são o caule e as folhas que fazem todas as suas funções. 
Genlisea violacea
Essas estruturas brancas são folhas subterrâneas modificadas altamente especializadas em capturar protistas
Foto de Noah Elhardt
Normalmente as espécies de plantas carnívoras que vivem em ambientes mais secos tem raízes mais desenvolvidas. Um exemplo bem conhecido é a da espécie Drosophyllum lusitanicum, que cresce em solos pobres derivados de Arenito (Rocha Sedimentar) no sul da Espanha e Portugal, onde os verões são quentes e secos (clima típico do Mediterrâneo). Devido ao seu sistema radicular bem desenvolvido Drosophyllum pode sobreviver 5 meses sem receber nenhuma gota de chuva (as plantas conseguem absorver a umidade que restou no solo). Byblis e algumas espécies de Droseras Australianas também possuem um extenso sistema radicular. 
Drosophyllum lusitanicum
Serra Madrona, Espanha
Foto de Javier Martin

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Drosophyllum lusitanicum
Serra Madrona, Espanha
Foto de Javier Martin
Ao contrário das plantas carnívoras de ambientes secos, as plantas carnívoras de ambientes extremamente úmidos possuem raízes pouco desenvolvidas (geralmente elas têm uma vida muito curta, são reduzidas, frágeis e são extremamente finas). Várias Droseras e Pinguiculas possuem apenas raízes vestigiais. Em algumas espécies as raízes se desenvolvem apenas durante uma parte do ano. Elas se desenvolvem durante a primavera/verão e morrem com a chegada do outono. No inverno, a planta é ancorada ao substrato apenas pelos restos mortos das raízes. 
Mas porque essa diferença entre as raízes de ambientes secos e úmidos ? Em habitats excessivamente úmidos (Campinaranas, Savanas de Pinheiros, Restingas, etc.) as raízes sofrem muito com a falta de oxigênio e nutrientes.

Você sabe qual é o habitat das plantas carnívoras ? Se não, da uma olhadinha nessa publicação que eu fiz, vai te ajudar muito: "O Habitat das Plantas Carnívoras - Onde elas Crescem ?".  

O solo desses habitats excessivamente úmidos (Espodossolos, Neossolos Quartzarênicos, Gleissolos, Organossolos) geralmente é cheio de água. Quanto mais encharcado estiver o solo, menor vai ser a quantidade de poros com oxigênio disponível (porque a maioria vai estar sendo ocupada pela água). Se o oxigênio não entra no solo, as raízes não conseguem respirar direito, e se elas não conseguem respirar, não conseguem se desenvolver, e se elas não se desenvolvem direito, não conseguem absorver os poucos nutrientes que estão disponíveis. 
Perfil de um Organossolo Háplico saturado com água
Cascavel, Paraná, Brasil
Foto de Gustavo Ribas Curcio
A baixa disponibilidade de nutrientes nesses ambientes está relacionada com duas características principais: excesso de água e matéria orgânica. 

Com relação ao excesso de água: se chove muito (ou se o solo fica alagado por períodos muito grandes) os minerais acabam sendo lixiviados (isto é, são levados embora pela água) e ficam naturalmente indisponíveis para as plantas (afinal, elas não podem absorver o que não existe). 

Com relação ao excesso de matéria orgânica: se existe muita matéria orgânica concentrada no solo, uma quantidade muito grande de ácido húmico acaba sendo produzida. Quanto mais ácido húmico o solo tiver, mais baixo o pH dele será. Muitos nutrientes que são fundamentais para o crescimento das plantas (como nitrogênio, fósforo, potássio, etc.) acabam ficando indisponíveis quando o pH está muito baixo (eles ficam meio que inertes, as plantas não conseguem absorve-los, mesmo eles estando presentes no solo). 

Resumindo o problema de se viver em solos encharcados: os nutrientes que estão no solo são constantemente levados embora por conta da ação da água, e o pouco que resta acaba não sendo absorvido direito por conta do pH estar baixo demais. Como sobreviver em um ambiente assim ? 

É bem difícil, poucas espécies de plantas conseguem tolerar essas condições. Para conseguirem sobreviver em solos tão pobres em oxigênio, as raízes de gêneros como Dionaea, Drosera, Pinguicula, Sarracenia e Darlingtonia possuem tecidos especiais para armazenar oxigênio e assim aumentar a oxigenação na zona da raiz. Pra conseguirem se desenvolver em solos tão pobres em nutrientes gêneros como Dionaea, Darlingtonia, Heliamphora, Sarracenia e Cephalotus desenvolveram tubérculos e rizomas para conseguir armazenar o pouco de nutrientes que elas conseguem absorver. 
Rizoma de uma Dionaea muscipula
Foto de mmlr38

O substrato ideal para as Plantas Carnívoras 
Como você já deve ter notado, essa questão de absorção de nutrientes em plantas carnívoras é meio complexa. Como não sabemos as preferências nutricionais da maioria das plantas carnívoras (ou seja, não sabemos a quantidade ideal de nutrientes que elas gostam de receber) nós acabamos preferindo cultiva-las em condições parecidas com aquelas onde elas seriam encontram na natureza (solos pobres e com baixo pH), assim temos certeza que não vamos matar nenhuma planta por engano (afinal, qualquer concentração de nutriente muito acima do ideal já é o suficiente para matar uma planta). 

Quando falamos em cultivo de plantas, uma das primeiras palavras que vem a nossa mente é substrato. Mas afinal, o que é um substrato ? Qual a diferença do substrato para a Terra e o Solo ? Se você não faz ideia de qual seja essa diferença, eu recomendo que primeiro você leia a minha publicação que responde justamente essa pergunta: "Solo, Terra e Substrato - Qual é a Diferença ?". 
A partir do momento que você sana essas dúvidas, tudo fica mais fácil. Bom, mas vamos continuar. 

O termo substrato se refere a qualquer material que seja sólido e que ao ser colocado em um recipiente, vai permitir o desenvolvimento de uma determinada criação (animais) ou cultura (plantas). 

No caso do cultivo de plantas, esse material sólido pode ter origem natural (ex fibra de coco) ou sintética (ex espuma fenólica). Se esse material sólido for de origem natural, ele pode ser feito de minerais (ex areia de sílica) ou de materiais orgânicos (ex serragem). O importante é que, ao ser colocado em um recipiente (de forma pura ou misturada) ele vai desempenhar o papel de suporte para a planta. 
Um bom substrato vai depender de qual planta eu vou cultivar (não posso plantar um Cacto no mesmo substrato que eu plantaria um pé de Alface). Mas, apesar disso, um bom substrato sempre deve ter as seguintes características: 

1 - Consistência para suporte (ou seja, deve conseguir manter a planta em pé). 
2 - Boa aeração (muito oxigênio em seus poros). 
3 - Boa permeabilidade (a água precisa passar por ele facilmente). 
4 - Poder de manter o pH estável (o substrato precisa manter o pH em um valor fixo constante). 
5 - Capacidade de retenção de nutrientes (precisa manter os nutrientes, quando estes forem adicionados). 
6 - Capacidade de reidratação após a secagem (ou seja, precisa absorver água, mesmo após ficar por um período completamente seco). 
7 - Ter alto teor de fibras resistentes à decomposição (isso permite que a estrutura do substrato se mantenha estável por mais tempo). 
8 - Estar isento de agentes causadores de doenças, pragas e sementes de plantas daninhas. 

No caso de plantas carnívoras, um bom substrato sempre vai ser aquele que consegue simular (ou seja, imitar) as condições naturais que elas encontrariam na natureza. Para maioria das espécies de plantas carnívoras, um bom substrato obrigatoriamente precisa ser ácido (ou seja, precisa apresentar baixos valores de pH) e precisa apresentar também uma baixa concentração de nutrientes. 
Plantas carnívoras também são normalmente encontradas em solos com baixas concentrações de oxigênio (Gleissolos são os mais comuns), mas esse atributo não precisa ser mantido no substrato que for utilizado. Quanto mais aerado for o substrato, melhor será o desenvolvimento da planta (na maioria das espécies pelo menos). 
Os substratos mais utilizados para o cultivo de plantas carnívoras são geralmente a Turfa (que nada mais é que o nome popular dos Organossolos) e o musgo Sphagnum, justamente por serem ambos ácidos e pobres em nutrientes. Porém, eles não são os únicos substratos a terem essas características. Um outro substrato que também apresenta essas mesmas características é a fibra/pó de coco. 

O que é o Coco ? Como ele é transformado em fibra/pó ? 
Primeiramente, um fruto (ou uma fruta, tanto faz) nada mais é que o ovário desenvolvido de uma flor (ou seja, a parte feminina da flor que foi polinizada) que já possui as sementes formadas no seu interior. Existem vários tipos de frutos diferentes, e cada um deles tem características diferentes. 
O Coco é um fruto do tipo Drupa, e morfologicamente ele dividido nas seguintes camadas: 

(1) Epicarpo: é aquela camada mais externa que reveste o coco (a famosa casca na maioria dos frutos). No coco ela tem uma cor verde e é bem lisa. 
(2) Mesocarpo: é a camada intermediária, e geralmente é a parte comestível na maioria dos frutos. No Coco, o mesocarpo corresponde aquela parte fibrosa super dura. No Coco, o Epicarpo e o Mesocarpo são chamados popularmente de casca. 
(3) Endocarpo: é a camada interna que está em contato com a semente. No caso do Coco, o Endocarpo corresponde a casca da semente (ou seja, toda essa parte marrom interna já é a semente do coco). 
Ilustração mostrando um Coqueiro (Cocos nucifera) e seu fruto
Ilustração de Franz Eugen Köhler


Ilustração mostrando a morfologia do fruto do Coqueiro (Cocos nucifera)
Ilustração da Embrapa, retirada do site monografias.brasilescola.uol.com.br

Essa parte branca do coco que nós comemos é chamada de Endosperma (ou copra, no caso da ilustração ai de cima). O Endosperma é o tecido nutritivo que mantem a semente viva. A água de coco nada mais é que o Endosperma, só que líquido. Em geral, 65% do peso do Coco corresponde a sua semente (Endocarpo, Endosperma Sólido e Endosperma Líquido), e 35% corresponde a sua casca (Epicarpo e Mesocarpo). 
A indústria utiliza a casca do coco para extrair aquilo chamado de fibras longas (coir fibre em inglês), que são usadas para produzir tapetes, cordas, cestas, etc. 
Fibra de Coco (fibras longas)
Foto de Fotokannan

Objetos que podem ser fabricados utilizando a fibra de coco (fibras longas)
Foto de Joep Vogels, Textielmuseum Tilburg


Durante o beneficiamento do coco para a produção dessas fibras longas, um outro produto é gerado como resíduo. Esse resíduo está sob a forma de fibras curtas e um pó muito fino, e é justamente esse resíduo que a gente conhece como pó de coco (coir pith ou coir dust em inglês). 
terra-para-plantas-carnívoras
Pó de Coco que eu comprei para cultivar minhas Plantas Carnívoras
As fibras, tanto as longas como as curtas são um tipo de tecido vegetal (as células individuais são chamadas de fibras, quando elas estão juntas formando um tecido, são chamadas de Esclerênquima). O pó de coco também é um tipo de tecido vegetal, e o seu nome é Parênquima. 
Corte anatômico do caule do Milho (Zea mays)
Foto de Atlas de histologia de plantas e animais
Essa imagem é um corte anatômico do caule do Milho (Zea mays), um parente distante do Coqueiro (Cocos nucifera). Essas bolinhas que vocês estão vendo são as células que compõem o caule do milho e essas cores são o resultado da mistura do corante Azul de Alcian e Safranina. 
As bolinhas pequenas avermelhadas são as células do Esclerênquima, e as bolinhas maiores com um tom de azulado são as células do Parênquima. Essas 5 bolas grandes com a borda avermelhada não são células do Esclerênquima, e sim células do Xilema (o tecido vegetal responsável por transportar água).
Se essa imagem fosse um corte anatômico do coco, todas as células estariam bem avermelhadas. O corante vermelho indica a presença de uma substância chamada Lignina, e o Esclerênquima e o Parênquima do coqueiro estão cheios dessa substância (daqui a pouco eu explico pra que ela serve). No caso do milho, só as células do Esclerênquima e Xilema tem a Lignina na sua composição. 

A casca do Coco (Epicarpo e Mesocarpo) é composta por cerca de 20 a 30% de Esclerênquima e 70 a 80% de Parênquima. 
Para cada quilo de fibra longa produzida, são gerados cerca de 2 kg de pó e fibras curtas. Cerca de 80 a 85% do peso bruto do coco verde é considerado como resíduo. Antigamente tudo isso era considerado como lixo, mas hoje, pra nossa sorte, tudo é aproveitado. 

A História da Fibra/Pó de Coco – Quando ela passou a ser utilizada como Substrato ? 
O Coqueiro (Cocos nucifera) é uma planta Asiática e desde os tempos remotos que ela vem sendo utilizada (principalmente pelo pessoal do Sri Lanka, Índia, Filipinas e Indonésia) para as mais diversas finalidades (alimentícias, cosméticas, decorativas, religiosas, construções, etc.). 
Mapa mostrando a distribuição natural do Coqueiro (Cocos nucifera)
Mapa feito por Niklas Jonsson
A partir do momento que os Europeus (mais precisamente os Holandeses) descobriram que os asiáticos conseguiam utiliza fibra/pó com sucesso no cultivo de plantas, trataram de importar o mais rapidamente possível a fibra/pó de coco para ser utilizada na horticultura. O substrato padrão utilizado na horticultura europeia era (e ainda é) a turfa (Organossolos). 
como-cuidar-de-plantas-carnívoras
Perda de área por conta da extração irresponsável da turfa
Os lagos se formam onde a turfa foi removida de maneira mais intensa
Nieuwkoopse plassen, Holanda
Foto retirada da publicação intitulada “Medieval smokestacks: fossil fuels in pre-industrial times
Os Europeus constataram que a fibra/pó de coco tem boas características físicas e foi testado com sucesso como um meio de crescimento para as plantas, porém, surgiram problemas (que estavam relacionados ao crescimento) no cultivo de algumas espécies, como por exemplo, Schefflera, Spathiphyllum (Lírio), Cupressocyparis leylandii (Cipreste), Dendranthema (Crisântemo) e Fragaria spp. (Morango). 
A partir dos sintomas visuais e da análise feita nas plantas, eles descobriram que as plantas apresentavam deficiências de Cálcio (Ca) e / ou Magnésio (Mg). A análise feita no substrato revelou que o problema foi causado pelo baixo conteúdo de Cálcio (Ca) e Magnésio (Mg), e um alto teor de Potássio (K) e Sódio (Na) na fibra/pó de coco. 

O que acontece é que a fibra/pó de coco naturalmente tem baixas concentrações de Cálcio e Magnésio e altas concentrações de Potássio e Sódio. O problema é que quando esses elementos químicos estão nessas quantidades (nessas proporções), um fenômeno muito interessante acontece. 
O que acontece é que (vou explicar de uma maneira simplificada, ta ? Nada de ficar quebrando a cabeça com termos complicados da química) quando o Potássio e o Sódio estão juntos em altas quantidades, eles impedem que as plantas absorvam o Cálcio e o Magnésio. Naturalmente existe um pouco de Cálcio e o Magnésio lá no substrato, mas as altas concentrações de Potássio e o Sódio fazem com que o Cálcio e o Magnésio fiquem tão firmemente grudados na fibra/pó de coco que as raízes não conseguem absorve-los. É por conta desse fenômeno que os europeus perceberam que as plantas cultivadas em fibra/pó de coco apresentavam deficiências de Cálcio e / ou Magnésio. 

As plantas cultivadas na turfa não apresentavam essas deficiências porque: 

1 - A turfa praticamente não tem minerais: a turfa é um solo de origem orgânica (Organossolos), e por conta disso naturalmente tem baixíssimas concentrações de minerais na sua composição. A turfa praticamente não libera quase nada de Potássio e Sódio. 

2 - A turfa usada era Tratada: a turfa recebe uma adição de Cálcio e Magnésio na sua composição (esse processo a gente chama de Calagem). Cálcio e Magnésio são minerais básicos/alcalinizantes e eles são utilizados pra aumentar o pH da turfa (o pH da turfa é muito baixo, sem esse processo de Calagem a maioria das plantas não conseguem crescer nela). Quando a turfa passa por esse processo de Calagem, dizemos que ela foi tratada. A turfa utilizada no cultivo de plantas na Europa geralmente é sempre tratada, então ela sempre vai ter Cálcio e Magnésio disponível para as plantas. 

A fibra/pó de coco não passava por esse processo de Calagem porque ela já tem um ótimo pH para o cultivo de plantas (4,8 – 5,9). Se ela passasse por esse processo de Calagem o pH dela iria ficar muito alcalino, o que não seria o ideal. 
Bom, então como foi que os europeus conseguiram resolver esse problema de deficiência da fibra/pó de coco ? 
Simples, lavando o substrato. Eles adicionavam Cálcio e Magnésio na fibra/pó de coco, e depois disso eles botavam ela de molho dentro d’água. Depois de um determinado tempo eles retiravam a fibra/pó e escorriam o excesso de água. 

Por incrível que pareça, bastava lavar a fibra/pó de coco com água que o excesso de Sódio e Potássio eram retirados, e o Cálcio e Magnésio que estavam presentes passavam a ficar disponíveis para serem absorvidos pelas raízes. Essa lavagem ficou conhecida como “tratamento”, e a fibra/pó de coco que passava por esse tratamento era chamada de “Fibra/Pó de Coco Tratada”. 
Os europeus então passaram a fazer testes com essa fibra/pó de coco tratada pra ver como seria o crescimento das plantas, e eles descobriram que o crescimento de plantas como Begônia, Dendranthema (Crisântemo) e Schefflera foi igualzinho ao da turfa (que era o substrato padrão que eles utilizavam em todas as plantas). Kalanchoe mostrou um crescimento vegetativo muito mais forte na fibra/pó de coco tratada do que na turfa. 

A partir do momento que ficou provado que as plantas cultivadas em fibra/pó de coco tratada poderiam crescer da mesma maneira ou até melhor do que na Turfa, ela passou a ser utilizada em todo mundo como um substrato comercial. 
No caso das plantas carnívoras, é extremamente benéfico o fato da fibra/pó de coco ter baixas concentrações de Cálcio, pois elas detestam esse elemento químico. O Sódio e o Potássio podem ser retirados da fibra dando uma lavada nela, e isso não é muito difícil de ser feito. 

Pontos Positivos e Negativos da Fibra/Pó de Coco 

1 - Consistência para suporte 
A fibra/pó de coco é excelente com relação a sua consistência. As raízes se fixam fortemente na fibra/pó e conseguem se manter muito estáveis sobre ela. A fibra da mais estrutura ao substrato do que o pó, então quanto mais fibra, mais estável o substrato vai ser. 

2 - Boa aeração 
A fibra/pó de coco possui em média uma capacidade de aeração de 45,5%, podendo variar entre 29 a 35%. Só pra você ter uma ideia, um substrato considerado ideal deve possuir uma capacidade de aeração entre 10 a 30%. Isso significa que a fibra/pó de coco é um substrato EXTREMAMENTE aerado. Quase metade do volume do seu volume vai ser ocupado por ar. 
Ao longo do tempo, todos os substratos ficam sujeitos a perder volume por conta da compactação, e isso não seria diferente com a fibra/pó de coco. A fibra/pó de coco tem uma perda maior de volume quando comparado com a turfa. Enquanto a turfa perde apenas 12% do seu volume, a fibra/pó de coco perde cerca de 24%, mas isso já é esperado. 
A fibra/pó de coco é um substrato muito aerado, então já está naturalmente sujeita a perder mais o seu volume. Já a turfa é um substrato pouco aerado, então ela não está sujeita a perder muito do seu volume (porque naturalmente ela já não tem isso pra poder perder). 
Para driblar essa perda de volume pela fibra/pó de coco, é só adicionar a mistura uma quantidade maior de fibra do que de pó. 

3 - Boa permeabilidade 
A fibra/pó de coco possui em média uma porosidade total de 95,6%. Só pra você ter uma ideia, um substrato considerado ideal deve ter uma porosidade acima de 85%. Isso significa que a fibra/pó de coco é EXTREMAMENTE permeável a água. Além de permeável, ela consegue reter grandes quantidades de água. 
1 litro de fibra/pó de coco consegue reter cerca de 538 ml de água, e cerca de 19,8% dessa água fica disponível para ser absorvida pelas plantas. Só pra você ter uma ideia, um substrato ideal deve deixar cerca de 20 a 30% de água disponível para ser absorvida pelas plantas (ou seja, a fibra/pó de coco chega bem perto). 
A densidade da fibra/pó de coco e a capacidade de retenção de água é bem mais baixa em comparação com a turfa, porém, isso pode ser um ponto positivo, pois em localidades mais quentes (por exemplo, Goiânia) a turfa e o Sphagnum acabam esquentando muito quando são expostos ao sol (já que eles tem uma capacidade gigantesca para reter água), e isso não acontece muito com a fibra/pó, já que ela retêm menos água e é menos densa. 

4 - Poder de manter o pH estável
Com relação aos valores de pH, nós podemos classifica-los da seguinte maneira: 

(1) Extremamente ácido quando for abaixo de 4,3 
(2) Fortemente ácido quando estiver entre 4,3 e 5,3 
(3) Moderadamente ácido quando estiver entre 5,4 e 6,5 
(4) Praticamente neutro quando estiver entre 6,6 e 7,3 
(5) Moderadamente alcalino quando estiver entre 7,4 e 8,3 
(6) Fortemente alcalino quando for maior que 8,3 

A fibra/pó de coco pode apresentar em média um pH entre 4,8 e 5,2, podendo chegar até 5,9, mas geralmente ele fica estável em 5,4. Isso faz da fibra/pó de coco um substrato fortemente ácido ou moderadamente ácido. Como é um substrato muito resistente a degradação, ele pode manter esses valores de pH por um longo tempo. 

5 - Capacidade de retenção de nutrientes
A fibra/pó de coco consegue reter mais nutrientes do que a turfa, porém, a partir do momento que ela está exposta a água (ou seja, é lavada) ela perde muito mais nutrientes do que em comparação com a turfa. Nitrogênio, Potássio e Sódio são facilmente removidos da fibra/pó quando ela está exposta a água. 

6 - Capacidade de reidratação após a secagem 
A fibra/pó de coco pode ser reidratada sem nenhum problema após um período de secagem. 

7 - Ter alto teor de fibras resistentes à decomposição
A fibra/pó de coco é um material composto de Lignina (35-45%), Celulose (23-43%) e uma pequena quantidade de Hemicelulose (3-12%). 
Falando de maneira beeeeeem simplificada: a Celulose e a Hemicelulose são substâncias que dão estrutura a célula vegetal (não deixam que a célula fique “molenga”) e a Lignina é uma substância que da rigidez a célula vegetal. Sabe a Madeira ? Ela é formada por células vegetais que estão impregnadas de Lignina, é por isso que ela é tão dura. A Lignina também é impermeável a água, ou seja, a água tem muita dificuldade ou não consegue passar por ela. 

Por conta dessas características, qualquer material que tenha Lignina na sua composição é extremamente difícil de decompor. Quanto mais Lignina o material tiver, mais demorado vai ser o seu processo de decomposição (é justamente por isso que um tronco de madeira demora tanto tempo para se decompor). Só microrganismos muito especiais conseguem decompor a Lignina (geralmente esse papel é dos fungos). 

A Celulose é bem menos resistente que a Lignina, porém mesmo assim é um material bem durável. Já a Hemicelulose é um material bem mais fácil de ser decomposto, então por conta disso é o primeiro componente a ser atacado pelos fungos e bactérias. 
Como a fibra/pó de coco é um material composto em sua maioria de Celulose impregnada com Lignina, ela é um substrato EXTREMAMENTE durável. Ela é indicada para o cultivo de plantas de ciclo longo (ou seja, que vivem muito tempo), pois como é resistente a degradação, ela dura muito tempo e não precisa ser trocada. Pode levar mais de 8 anos para a fibra/pó de coco ser totalmente decomposta pelos microrganismos. 
Pra decompor a fibra/pó de coco de maneira mais rápida, só mesmo cozinhando o substrato em temperaturas muito elevadas (200 a 550º C). 

8 - Estar isento de agentes causadores de doenças, pragas e sementes de plantas daninhas 
Foram encontradas muito mais fungos e bactérias na fibra/pó de coco do que na turfa, e isso é óbvio e já é esperado. A fibra/pó de coco é um material orgânico que ainda não foi decomposto, então enquanto ela estiver exposta, muitos organismos vão tentar viver sobre ela (se alimentar dela, se reproduzir sobre ela, etc.). A turfa, por outro lado, é um material que já foi parcialmente ou totalmente decomposto. Ou seja, se já não tem nadar para decompor, os organismos vão fazer o que sobre ela ? 

Essa questão do número de bactérias na fibra/pó de coco ser mais alta é extremamente benéfica. A partir do momento que essas bactérias (que se alimentam direta ou indiretamente da fibra) se instalam e aumentam o seu número, elas impedem que outras bactérias patogênicas (causadoras de doenças) se instalem na zona das raízes. 

9 - Outros 
Outros valores apresentados (também em média) pela fibra/pó de coco são (esses eu não vou explicar, pra nós que cultivamos plantas apenas por hobby isso não é lá muito importante): 

(1) Condutividade Elétrica (CE) =1,8 dS/m 
(2) Capacidade de Troca Catiônica (CTC) = 92 
(3) Relação Carbono/Nitrogênio (C/ N) =13:2 
(4) Densidade (D) =70 g/L 

As boas propriedades físicas e químicas, sua longa durabilidade (sem alteração de suas características físicas), a sua enorme abundância (é um material bem mais fácil de achar) e o seu baixo preço (em comparação com a turfa e o Sphagnum) fazem da fibra/pó de coco um substrato alternativo ideal para ser utilizado em plantas carnívoras. 

Na segunda parte dessa publicação eu vou mostrar pra vocês como preparar esse substrato e as experiências de cultivo de algumas pessoas que já utilizaram ele. 

A segunda parte é essa aqui: "Substrato para Plantas Carnívoras - Fibra/Pó de Coco - Parte 2". 

Comentários

  1. Existem droseras em Cascavel PR ou região???

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    Respostas
    1. De acordo com o Flora do Brasil, não. Elas só vão ocorrer mais próximo do litoral do seu estado

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