Formigas - Rainhas, Machos e a Fundação da Colônia

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Rainha Leptogenys confucii botando um ovo 
Foto de SShattuck 

Na publicação “Formigas - Como surgiu a primeira colônia de Formigas ?” eu mostrei como foi que evoluiu o comportamento social das formigas. Agora nessa publicação eu vou mostrar pra vocês as diferenças entre machos, rainhas e como se inicia a fundação de uma colônia. 


Relembrando 

As formigas só surgiram na história quando a Eussocialidade foi finalmente estabelecida. A Eussocialidade é um tipo de sistema social que ocorre dentro das sociedades do tipo colônia. 

Nas sociedades do tipo colônia existem vários tipos de sistemas sociais, e a Eussocialidade é o mais avançado e complexo deles. Os insetos sociais que possuem esse tipo de sistema (os chamados insetos eussociais) são considerados como tendo o modo de vida mais complexo entre os insetos. 

O que é preciso para ser considerado um inseto eussocial ? Para serem considerados insetos eussociais, as sociedades do tipo colônia precisam apresentar 3 características fundamentais: 

(1) - Indivíduos de uma mesma espécie precisam cooperar para cuidar dos filhotes. 
(2) - Precisa existir uma divisão com relação a reprodução e ao trabalho dentro da sociedade (formação de castas), com os indivíduos mais ou menos estéreis (as operárias) trabalhando em função dos companheiros de ninho fecundos (a rainha). 
(3) - Tem que ocorrer uma sobreposição de pelo menos duas gerações dentro da sociedade, de modo que a prole (os filhos, as operárias) possa ajudar a mãe (a rainha) durante algum período de suas vidas dentro da colônia. 

A Eussocialidade só surge na história quando esse item aqui fica estabelecido: (2) - Precisa existir uma divisão com relação a reprodução e ao trabalho dentro da sociedade, com os indivíduos mais ou menos estéreis (as operárias) trabalhando em função dos companheiros de ninho fecundos (a rainha).” 

A divisão com relação a reprodução e ao trabalho é um passo fundamental para o surgimento da Eussocialidade, pois é só a partir dele que os papeis de “Rainha” e “Operária” são realmente estabelecidos. 

Divisão da Colônia - Funções 

Quando estamos falando de formigas, e chegamos nessa parte de falar sobre divisão de tarefas, a palavra “casta” começa a aparecer. Se uma formiga (ou determinado grupo de formigas) se especializa em fazer alguma coisa (como defender o ninho) geralmente o pessoal já fala que elas formam uma “casta a parte” dentro da colônia. 
Exemplo: “Essas formigas tem mandíbulas grandes, são especializadas na defesa do ninho, por isso elas formam uma casta dentro da colônia”. 

A questão é que o termo “casta” é ABSURDAMENTE CONFUSO na literatura científica. Pesquisadores diferentes dão significados diferentes pra essa mesma palavra, por isso não podemos sair definindo qualquer coisa como casta. 

Aqui nessa publicação, o termo “casta” vai ser usado pra falar na divisão que existe entre formigas reprodutoras e não reprodutoras dentro da colônia. Se tem alguma formiga especializada em botar ovos, ela vai fazer parte da casta dos reprodutores. Se existem formigas especializadas nos afazeres da colônia (especializadas em buscar comida, cavar tuneis, etc.) elas vão fazer parte da casta dos trabalhadores. Conseguiu entender ? Então vamos continuar. 

Divisão da Colônia - Reprodutores 

As formigas especializadas em reproduzir dentro da colônia recebem o nome de “Rainha”. Os machos, com uma importância bem menor dentro da colônia, são chamados apenas de machos. 

Rainha 
A função da rainha é exclusivamente reprodutiva, ela passa a vida toda botando ovos para manter um número de operárias estável dentro da colônia. Para manter uma alta taxa de produção de ovos ela possui um sistema reprodutor extremamente bem desenvolvido. 

O ovário é tão desenvolvido que a rainha pode (sozinha) sustentar uma colônia com centena de milhares de indivíduos (quanto maior for a colônia, maior o número de operarias que precisam ser produzidas). E a rainha ainda pode continuar botando ovos por toda a sua vida (o que em algumas espécies, como no gênero Atta, significa várias décadas). Só pra exemplificar, uma rainha de Dorylus wilverthi pode botar cerca de 3 a 4 milhões de ovos por mês. Ao longo da sua vida ela pode botar até 250 milhões de ovos. 

Na maioria das espécies de formigas as rainhas possuem asas para voar, porém em algumas espécies elas são pouco desenvolvidas ou simplesmente não existem. De qualquer forma, as asas são utilizadas apenas em um curto período de tempo e depois são descartadas pela rainha. 
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Rainha do gênero Camponotus 
Foto de Detroitius

Machos 
A única função dos machos é procurar por rainhas e acasalar com elas. Dentro da colônia em sí, os machos não fazem absolutamente nada, eles apenas ficam aguardando o momento certo para procurar pelas rainhas (que vida maravilhosa). Como eles não possuem função dentro da colônia, eles possuem uma expectativa de vida bem curta. Depois que eles acasalam, eles morrem. 

Os machos procuram pelas rainhas quando elas decidem fundar suas próprias colônias (ou seja, quando elas estão saindo da colônia onde nasceram). Pra fundar suas próprias colônias as rainhas precisam acasalar com um macho, e só por isso que elas precisam deles.

Macho de Camponotus pennsylvanicus 
Fotos de Bruce Marlin, retirada do site “www.cirrusimage.com

A forma como o macho procura pela rainha vai depender da forma como ela funda sua própria colônia. Diferentes tipos de fundação possuem diferentes tipos de procura pelo macho. 

Síndrome de Agregação Masculina 

Esse tipo de síndrome acontece quando as rainhas fundam suas colônias sozinhas ou em grupo com outras rainhas. Nesse caso os machos e as rainhas tem asas e ambos saem de suas colônias ao mesmo tempo. 

Geralmente eles costumam sair juntos de forma sincronizada após algum estímulo ambiental, como a volta das chuvas depois de longos meses de seca. Essas situações são bem específicas, acontecem algumas vezes ou apenas uma vez por ano. 

Os machos saem de suas colônias e se reúnem em grandes quantidades atrás das rainhas (se reúnem as dezenas, centenas ou mesmo aos milhões de indivíduos). Em Solenopsis invicta os machos voam a altitudes de 250 metros ou mais e a maioria deles percorre uma distância de pelo menos 2 quilômetros. 

Existem espécies onde o macho procura pelas rainhas em pleno ar, fazendo aquilo que a gente conhece como “revoada” ou “vôo nupcial”. Os machos ficam voando em uma determinada área até que uma rainha passe voando. Quando ela passa, os machos vão atrás dela e a seguram. Depois que o casal é formado, eles dessem para o chão para terminar o acasalamento. 
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Rainhas saindo para a revoada 
Foto retirada do site “www.terro.com” 

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Revoada de Acromyrmex versicolor 
Arizona, Estados Unidos 
Fotos de Pam in Tucson, retiradas do blog “pashack1.blogspot.com

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Acasalamento de machos e rainhas de Acromyrmex versicolor 
Arizona, Estados Unidos 
Fotos de Pam in Tucson, retiradas do blog “pashack1.blogspot.com


Existem outras espécies onde os machos se reúnem, porém eles ficam esperando pelas rainhas no chão. Assim que o acasalamento terminar, a rainha destaca/quebra as próprias asas e vai procurar por um local para começar a construir a sua colônia. 

Como eu falei anteriormente, nessa síndrome a rainha funda sua colônia sozinha ou em grupo com outras rainhas. Elas podem fazer isso de maneira Claustral ou Semiclaustral. 

Fundação Claustral 
Nesse tipo de fundação a rainha constrói uma câmara ou procura por uma já feita. Essa câmara pode ser feita no solo, na madeira, de baixo de pedras, etc. Depois que se estabelece, a rainha se fecha dentro dela e não sai mais. 

A rainha bota um lote de ovos e fica vigiando eles até o nascimento das primeiras larvas (isso depois de várias semanas). A rainha alimenta as larvas com secreções especiais ou bota ovos não fertilizados para servir como alimento. Desde o momento que bota os ovos, até o nascimento das primeiras trabalhadoras, a rainha fica sem se alimentar. Ela sobrevive graças as reservas de energia de seu próprio corpo. É justamente por isso que essas rainhas costumam ser enormes, elas possuem muitas reservas estocadas (as reservas de gordura podem representar 40% ou até mesmo 60% do peso da rainha). A rainha só vai se alimentar novamente quando as trabalhadoras forem buscar alimento fora da câmara (e isso pode demorar vários meses). 

Espécies que fazem a Fundação Claustral pertencem ao gênero Camponotus, Pheidole, Atta, Solenopsis, Crematogaster, etc. 
Rainha do gênero Camponotus em seu ninho escavado na madeira 
Foto retirada do blog “blog.wildaboutants.com


Fundação Semiclaustral 
Nesse tipo de fundação a rainha também constrói uma câmara ou procura por uma já feita. Porém, depois que se estabelece a rainha não se fecha dentro da câmara. 

A rainha não alimenta as larvas com secreções especiais ou bota ovos não fertilizados para servir como alimento. Ela sai continuamente da câmara para buscar comida para as larvas e para ela mesma. Essas rainhas não tem grandes reservas de energia estocadas em seus próprios corpos, então precisam comer continuamente para sobreviver. A rainha só para de se aventurar para fora da câmara quando as trabalhadoras passarem a buscar alimento para ela. 

Espécies que fazem a Fundação Semiclastral pertencem ao gênero Ectatomma, Pachycondyla, Odontomachus, Acromyrmex, Myrmecia, etc. Esse tipo de fundação é típico de formigas caçadoras, como as da subfamília Ponerinae. 

Rainha Pachycondyla striata 
Reparem no tamanho do ferrão 
Foto de April Nobile 

Observação 
Apesar de existirem espécies onde as rainhas fundam suas colônias em grupo, a maioria das espécies acabam tendo problemas posteriormente. Diferentes tipos de situações podem ocorrer: 

(1) - Depois que as primeiras trabalhadoras aparecem, as rainhas lutam entre sí para decidir quem vai reinar (o que pode significar uma luta até a morte). Uma situação como essa acontece com Lasius sp. 
(2) - Depois que a colônia se estabelece, as trabalhadoras expulsam ou executam o excesso de rainhas até sobrar apenas uma. Isso acontece com Myrmecocystus sp e Solenopsis invicta. 
(3) - Depois que nascem as primeiras trabalhadoras as rainhas passam a ficar agressivas umas com as outras e cada uma vai para um lado da colônia (são formados vários territórios dentro do mesmo ninho). Essa situação pode ser vista em Camponotus herculeanus, Camponotus ligniperda e Iridomyrmex. 


Síndrome de Agregação Feminina 


Tipo 1 – Rainhas com asas 
Nesse caso específico a síndrome acontece quando as rainhas fundam suas colônias sozinhas. Nessa síndrome os machos e as rainhas tem asas. 

Os machos e rainhas saem (ou pelo menos costumam sair) de suas colônias ao mesmo tempo de forma sincronizada, porém nessa síndrome as fêmeas não se afastam muito da sua colônia natal. 

Elas saem, mas ficam nas proximidades da colônia, escondidas no solo ou na vegetação ao redor. Elas ficam paradas e liberam feromônios sexuais para atrair os machos. 
Assim que o acasalamento terminar, a rainha destaca/quebra as próprias asas e vai procurar um local para começar a construir a sua colônia. 

Exemplo de espécies que possuem esse comportamento são Amblyopone e Paltothyreus (ambos da subfamília Ponerinae) e Nothomyrmecia macrops. Nesse caso as rainhas costumam ser Semiclaustrais. 
Rainha de Amblyopone australis 
Foto de CrazyLegs, retirada do site “www.formiculture.com


Tipo 2 – Rainhas Braquípteras e Ergatóides 
Nesse caso específico a síndrome acontece quando a rainha (ou as rainhas) fundam sua nova colônia com ajuda de trabalhadoras da sua antiga colônia. Ou seja, a rainha sozinha não consegue formar uma colônia por conta própria (portanto aqui não existe fundação Claustral e Semiclaustral). 

Nesse caso apenas os machos possuem asas funcionais e apenas eles ficam responsáveis por ir atrás das rainhas. As rainhas nesse caso nascem sem asas ou elas não são funcionais (são muito curtas para voar). 

As rainhas que tem asas curtinhas são chamadas de Braquípteras. 
Rainha Braquíptera Monomorium subapterum 
Ilustração retirada do site “www.antwiki.org
 


Já as rainhas que nascem sem asas são chamadas de Ergatóides. 
Rainha Ergatóide Myrmecia esuriens 
Foto de BJCAM43 

Rainhas Ergatóides geralmente se parecem com outras trabalhadoras dentro da colônia, porém em algumas espécies as rainhas Ergatóides possuem formas totalmente diferentes. Nas espécies de formiga correição/formiga de exército (“army ants” em inglês) as rainhas vivem em colônias gigantescas e, portanto, estão adaptadas a botar milhões de ovos. Por conta disso elas possuem tamanhos enormes. 

Operárias e rainhas da formiga correição Aenictus laeviceps 
Fotos retiradas do blog “blog.livedoor.jp” 


Os encontros entre machos e rainhas não acontecem de forma muito sincronizada, podem até acontecer em qualquer época por exemplo. Os machos encontram as rainhas indiretamente. Ao invés de procurar pelas rainhas em si, os machos procuram pela sua colônia de origem. 

Eles vão procurando pelas trilhas feitas pelas trabalhadoras, e quando encontram, seguem elas até a entrada no ninho. Eles podem acasalar com as fêmeas na entrada do ninho ou dentro dele. Esses machos podem passar vários dias ou semanas procurando pelas rainhas, então eles possuem corpos grandes e volumosos (eles tem muita energia armazenada para permitir a procura pelas rainhas). 
Macho de Dorylus helvolus 
Foto de Bernard DUPONT

Macho do gênero Dorylus 
Foto de Alex Wild, retirada do site “myrmecologicalnews.org
 

Essa síndrome acontece com gêneros como Leptogenys (Leptogenys ocellifera e Leptogenys chinensis), Megaponera (Megaponera foetens), Dorylus, Eciton, Mystrium, etc. Essa síndrome é típica de formigas caçadoras, só na subfamília Ponerinae ela ocorre em mais de 15 espécies. 

Como eu falei anteriormente, essas rainhas Braquípteras e Ergatóides fundam suas novas colônias com ajuda de trabalhadoras de sua antiga colônia. Elas fazem isso principalmente por Fissão. 


Fundação por Fissão 
A fissão acontece quando ocorre uma divisão interna na colônia. Parte das trabalhadoras permanecem no antigo ninho junto com a rainha fundadora, seus ovos e larvas, e outra parte vai embora a pé junto a nova rainha (filha da rainha fundadora). 

A nova rainha que vai embora ainda é virgem, e só pode começar a produzir suas próprias trabalhadoras depois que acasalar com um macho. Por isso assim que ela se estabelece em um novo ninho, ela passa a liberar feromônios sexuais para atrair os machos. 
A fissão só pode acontecer em colônias maduras/grandes, pois é preciso um grande número de trabalhadoras para que a colônia possa ser dividida em duas. 

A Fundação por Fissão ocorre em espécies que se movimentam com muita frequência. Geralmente as espécies ocupam vários ninhos diferentes (e por isso estão circulando o tempo todo), ou se mudam de local com muita frequência ou são simplesmente nômades (nunca se fixam em um local, estão sempre em marcha). 

As formigas correição/formigas de exército são as espécies nômades mais conhecidas. 




Colônia da formiga correição Aenictus laeviceps 
A colônia estava de mudança para um novo ninho. A mudança só foi terminar depois de 6 horas 
Fotos retiradas do blog “blog.livedoor.jp” 

Colônia da formiga correição Eciton burchellii 
A colônia estava de mudança para um novo ninho 
Foto de Geoff Gallice 

Acampamento da formiga correição Eciton 
O acampamento é feito com a união dos corpos das próprias operárias 
Foto de Geoff Gallice 



Essa publicação faz parte do guia “Criação de Formigas - O que eu preciso saber ?”. Todas as referências utilizadas aqui vão estar listadas lá no guia.

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